quinta-feira, 9 de junho de 2011

Cap IV - Como o Dinheiro se Transf em Capital / Item 2 (p. 175 a 186)

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 No item 2 do capítulo em questão, Marx ocupa-se em mostrar que o comércio e seus pormenores - preços, o ato da permuta em si - não explicam a geração de mais-valia e, portanto, também não explicam a transformação de dinheiro (instrumento de troca de mercadorias) em capital (o dinheiro em busca de mais dinheiro). No entanto, é na circulação que se encontra o trabalho humano, o que acrescenta valor ao material ao se adicionar nele novo trabalho. Logo, o capital, apesar de não se originar na circulação, como percebido primeiramente, origina-se na circulação também, porque advém da maior quantidade de trabalho inserida. Percebe-se um problema para o capital: um possuidor de dinheiro, que está no estágio anterior de se tornar um capitalista, tem de comprar as mercadorias por seu valor, vendê-las por seu valor e, mesmo assim, extrair no final do processo mais valor do que lançou nele, o que deve e não deve ocorrer na esfera da circulação.
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2. CONTRADIÇÕES DA FÓRMULA GERAL

A forma de circulação na qual o dinheiro se revela como capital contradiz todas as leis investigadas anteriormente sobre a natureza da mercadoria, do valor, do dinheiro e da própria circulação.

A sequencia inversa dos dois processos opostos na circulação, venda e compra,  só existe para UM dos três parceiros do negócio. Um indivíduo C, enquanto capitalista, compra mercadoria do parceiro A e a revende para o parceiro B. Enquanto simples possuidor de mercadorias, C vende mercadoria para o parceiro B e compra mercadoria do parceiro A.

Para os parceiros A e B, não há diferença nesses processos. A conexão dos dois atos existe apenas para C. O primeiro ato de C, uma compra, foi uma venda aos olhos do parceiro A. O segundo ato de C, uma venda, foi uma compra do ponto de vista de B.

Pode-se dizer que a inversão de sequência realizada por C é supérflua. O parceiro A venderá a mercadoria diretamente para B, e B comprá-la diretamente de A, o que reduz a sequência em um ato de circulação simples de mercadorias. Não é daí que se perceber o acréscimo de valor, a geração de mais-valia.

Considerando o processo de circulação simples, sabe-se que o dinheiro serve como expressão dos valores das mercadorias em seus preços, não se confrontando materialmente com as mercadorias.

À medida que se trata do valor de uso, ambos os permutadores podem ganhar. Eles alienam bens que não lhes são úteis como valor de uso e adquirem mercadorias de que necessitam para uso.

Com o valor de troca é diferente. Deixando de considerar as circunstâncias que não se originam das leis da circulação simples, ocorre na circulação uma mudança de forma da mercadoria. O mesmo valor permanece nas mãos do possuidor de mercadoria: primeiro na figura de sua mercadoria, depois na do dinheiro em que se transforma e, finalmente, na da mercadoria a qual esse dinheiro se “retransforma”.

Por trás das tentativas de apresentar a circulação de mercadorias como fonte de mais-valia, espreita uma confusão entre valor de uso e valor de troca, equívoco reproduzido por muitos economistas modernos, que atribuem ao comércio a geração de valor.

Em sua forma pura, o processo de circulação das mercadorias exige a troca de equivalentes. Suponhamos, no entanto, que as coisas na realidade não se passam de modo puro, considerando uma permuta de bens não-equivalentes. Só o possuidor de mercadorias se confronta com possuidor de mercadorias e o poder que essas pessoas exercem umas sobre as outras é apenas o poder de suas mercadorias. A diferença material delas é o motivo central da troca e torna os possuidores de mercadorias reciprocamente dependentes, pois ninguém mais produz tudo do que precisa, percebendo nas mãos de terceiros um objeto de necessidade.

Admitindo que um vendedor, por um privilégio qualquer, venda mercadoria acima do seu valor - a 110 quando ela vale 100 – percebe-se um excedente de 10. Após ter sido vendedor, ele, no entanto, torna-se um comprador e pagará mais caro a um terceiro, detentor de mercadoria de seu interesse que goza do mesmo privilégio. Aí o comprador, antes vendedor, perde 10. Em outras palavras, o aumento – e também a diminuição - nominal e geral do preço não acarreta efeitos nas relações de valor. Assim, a formação de mais-valia e a transformação de dinheiro em capital não são explicadas pelas diferenciações de preços. Na permuta de mercadorias, não se produz valor. Logo, o capital não se origina na circulação.

Em respeito ao valor da mercadoria, a relação se limita ao fato de que ela contém quantidade de seu próprio trabalho, medida conforme determinadas leis sociais, expressando-se na grandeza de valor de sua mercadoria e materializada em dinheiro, em um preço. Pode-se aumentar o valor de uma mercadoria, acrescentando, mediante mais trabalho, novo valor ao valor original. Quando um homem produz uma roupa a partir de algodão, ele está valorizando o material, pois depositou maior quantidade de trabalho. 

Assim, o capital, apesar de não se originar na circulação, como vimos, origina-se na circulação. Lembremos: não se origina porque, no comércio, os preços podem oscilar, mas isso não valoriza as mercadorias; e origina-se porque advém da quantidade de trabalho inserida, de novo trabalho.

Temos um resultado duplo. A transformação do dinheiro em capital tem de ser explicada com base nas leis imanentes da troca de mercadorias de modo que a permuta de equivalentes sirva de ponto de partida. Um possuidor de dinheiro, um “pré-capitalista”, tem de comprar as mercadorias por seu valor, vendê-las por seu valor e, mesmo assim, extrair no final do processo mais valor do que lançou nele, o que deve e não deve ocorrer na esfera da circulação. Esse problema se mostrará como a própria solução.

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